Alexei Navalny, principal opositor do presidente russo Vladimir Putin, morreu aos 47 anos na prisão, anunciou o Serviço Penitenciário Federal nesta sexta-feira. Em comunicado, o órgão afirmou que ele “sentiu-se mal após uma caminhada, perdendo quase imediatamente a consciência”. Médicos da instituição teriam sido chamados, e “todas as medidas de reanimação necessárias foram realizadas, mas não tiveram resultados positivos”. O órgão afirmou que as causas da morte estão sendo investigadas. Porta-voz de Navalny, Kira Yarmysh declarou que ainda não tem “nenhuma confirmação” sobre a morte dele.
O advogado do opositor está a caminho da prisão para buscar mais informações sobre o ocorrido, continuou Yarmysh. Já o porta-voz do governo russo, Dmitry Peskov, disse que o Serviço Penitenciário Federal está “verificando e estabelecendo” o que aconteceu com Navalny, e que “não são necessárias ordens especiais [do Kremlin]”. Ele também indicou que Putin foi informado sobre a morte, mas ressaltou que “caberá aos médicos” o esclarecimento sobre a causa do ocorrido.
Nas redes sociais, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, escreveu que “Alexei Navalny lutou pelos valores da liberdade e da democracia”, e que, “por seus ideais, ele fez o sacrifício supremo”. Ele acrescentou que “a União Europeia responsabiliza o regime russo por esta morte trágica”. O ministro das Relações Exteriores da Noruega, Espen Barth Eide, reforçou que Moscou carrega “uma grande responsabilidade” pelo caso. O primeiro-ministro britânico, RIshi Sunak, disse que o incidente é “uma enorme tragédia” para o povo da Rússia.
Em janeiro, Alexei Navalny havia aparecido em imagens pela primeira vez desde que foi transferido para uma colônia penal em Kharp, no Ártico russo, em dezembro. Na época, a equipe dele tinha ficado três semanas sem receber notícias, e pouco se sabia sobre seu estado de saúde. Há pouco mais de um mês, ele participou de uma audiência da Suprema Corte que avaliava suas queixas sobre as condições de sua detenção na Sibéria. Ele afirmou, na ocasião, que era submetido a temperaturas “congelantes”, que chegavam a 32 graus negativos.
— A cela de punição costuma ser um lugar muito frio — afirmou ele. — Você sabe por que as pessoas escolhem um jornal lá [um dos itens que podem receber na cela]? Para se cobrirem. Porque com um jornal, posso dizer a vocês, juízes, é muito mais quente dormir, por exemplo, do que sem ele. E então você precisa de um jornal para não congelar.
Navalny também se queixou do limite de tempo para fazer as refeições.
— É impossível comer em 10 minutos — relatou à Corte. — Se você comer todos os dias em 10 minutos, [fazer] esta refeição se tornará um processo bastante complexo.
Apesar das queixas, Navalny parecia estar de bom humor. Ele chegou a brincar, durante a audiência, que ainda não havia recebido nenhuma correspondência de Natal por estar “muito longe”.
A meses da eleição presidencial no país, Alexei Navalny foi levado para a colônia penal número 3, na localidade de Kharp, anunciou a porta-voz do ativista, Kira Yarmish, na rede social X (antigo Twitter), na última semana de dezembro. Na ocasião, Navalny disse estar “bem”. A viagem até sua nova prisão durou 20 dias e foi “bastante cansativa”, declarou ele na rede X.
Até o início de dezembro, ele estava detido na colônia da região de Vladimir, a 250 quilômetros de Moscou.
Navalny, um ativista anticorrupção e um dos principais adversários políticos do presidente Vladimir Putin, cumpre pena de 19 anos de prisão por “extremismo”. Ele foi detido em janeiro de 2021 ao retornar à Rússia, depois de se recuperar na Alemanha de um envenenamento que, segundo ele, foi planejado pelo Kremlin.
Kharp, uma pequena cidade de 5 mil habitantes, situa-se em Yamalia-Nenetsia, uma região remota no norte da Rússia. A localidade fica além do Círculo Polar Ártico e abriga várias colônias penais. Um dos principais colaboradores de Alexei Navalny, Ivan Zhdanov, afirmou que esta é “uma das colônias mais remotas” da Rússia. As condições lá são “difíceis”, escreveu na rede X.
“As condições lá são duras, com um regime especial na zona de permafrost” e muito pouco contato com o mundo exterior, disse Jdanov. O permafrost é uma camada do subsolo da crosta terrestre que está permanentemente congelada.
De acordo com o veredito de “extremismo” pronunciado contra ele, o opositor tem de cumprir a pena em uma colônia de “regime especial”. Nessa categoria, a mais gravosa na Rússia e normalmente destinada aos condenados à prisão perpétua ou aos detentos mais perigosos, as condições de detenção são mais duras.
“Desde o início, ficou claro que as autoridades queriam isolar Alexei Navalny, especialmente antes da eleição presidencial”, prevista para março de 2024, acrescentou Zhdanov.
De acordo com a agência Reuters, a nova prisão de Navalny é conhecida como colônia “Polar Wolf” (“Lobo Polar”) e considerada uma das prisões mais difíceis de se ficar na Rússia. Os invernos são rigorosos, e a previsão é que as temperaturas caiam a cerca de 28 graus Celsius negativos na próxima semana.
Localizada às margens do rio Sob, a Polar Wolf é uma das sete colônias de trabalho corretivo de segurança máxima operadas pelo Serviço Penitenciário Federal para condenados à prisão perpétua, status este que ganhou em 2004, segundo o site Atlas News. O portal afirma ainda que a prisão é composta por “caldeira, padaria, usina a diesel, cantina e departamentos de produção para os presos fazerem blocos de concreto e brita”.
Ainda segundo o site, há também oficinas de marmoraria, costura, alfaiataria e carpintaria. Os condenados podem receber um pacote por ano e podem passear em uma pequena jaula uma vez por dia durante 90 minutos.
“[Os detidos] Possuem cama, mesa, criado-mudo, prateleira fechada onde podem guardar alimentos, prateleira para produtos de higiene pessoal, caixa d’água, cabide e vaso sanitário. Os presos não podem deitar na cama durante o dia e não podem conversar com outros presos. Todos os movimentos são realizados algemados”, descreve o portal.
A prisão foi fundada em 1960 como parte do sistema de campos de trabalhos forçados soviéticos, de acordo com o jornal Moskovsky Komsomolets, destaca a Reuters.
As transferências de um centro penitenciário para outro na Rússia podem levar várias semanas em viagens de trem, com várias etapas. E as famílias dos detentos não recebem informações durante o período.
A falta de notícias sobre Alexei Navalny gerou preocupação em vários países ocidentais e na ONU.
O movimento de Navalny foi minado de maneira metódica pelas autoridades russas nos últimos anos, com vários de seus colaboradores e aliados sendo presos, ou indo para o exílio.
As autoridades iniciaram novos processos judiciais por “vandalismo” contra o opositor, o que pode resultar em mais três anos de detenção.
Nesse cenário, com a oposição quase inexistente e a repressão intensa a qualquer voz crítica, Putin aspira sem problemas a um novo mandato de seis anos na Presidência da Rússia nas eleições de março de 2024.
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